8.29.2011

Gary Snyder


Passar um tempo com sua própria mente é algo humilde e expansivo. Descobrimos que não há ninguém no comando, e somoslembrados de que nenhum pensamento dura muito. As marcas dos ensinamentos budistas são a impermanência, a ausência de ego, a inevitabilidade do sofrimento, a interconexão, a vacuidade, a vastidão da mente e a oferta de um Caminho para a realização. Um poema acabado, como uma vida exemplar, é uma breve apresentação, algo único na singularidade, uma expressão completa, e um tipo de troca de presentes nas redes da mente-energia. Na peça no Basho (Bananeira), diz-se que “toda poesia e toda arte são oferendas para o Buda”. Essas várias ideias budistas, em conjunto com o antigo sentido chinês de poesia, são parte da trama que produziu uma simplicidade elegante, a que damos o nome de estética zen.
Tu Fu disse: “As ideias de um poeta deveriam ser nobres e simples”. Nos círculos Ch’an se dizia: “Pessoas incultas deliciam-se no estardalhaço e na novidade. Pessoas cultas deliciam-se no comum”. Essa simplicidade, essa realidade comum, é o que os budistas chamam de quididade, ou tathata. Não há nada especial na realidade, porque ela está toda exatamente aqui. Não é preciso chamar atenção para ela, apresentá-la vividament e exibi-la. Portanto, o tema derradeiro de uma poesia budista “mística” é profundamente comum. Essa elusiva realidade comum que é tão tocante e refrescante, toda revolvida em imaginação e linguagem, é o trabalho de todas as artes. (Os poemas realmente belos são talvez os invisíveis, que não exibem nenhum insight especial, nenhum beleza notável. Mas em verdade ninguém nunca escreveu um grande poema que perfeitamente não tivesse nenhum insight, nenhum desdobramento instrutivo, nenhum prazer sintático — este é apenas um ideal distante.)
Assim, nunca haverá um único tipo identificável de “poesia meditativa”. Apesar do elegante e algo decadente ideal da Simplicidade Zen, o estardalhaço, a novidade e a vulgaridade entusiasmada também são completamente reais. Olhos arregalados, línguas para fora, entradas arrebatadoras, palmas e uivos — todos fazem parte da tradição da prática. E nunca haverá — é o que devotamente se espera — um estilo final e exclusivo de budismo. Continuo buscando poemas que veem o momento, que brincam livremente com o que é dado,
Teasing the demonic
Wrestling the wrathful
Laughing with the lustful
Seducing the shy
Wiping dirty noses and sewing torn shirts
Sending philosophers home to their wives in time for dinner
Dousing bureaucrats in rivers
Taking mothers mountain climbing
Eating the ordinary

[Fazendo graça com o demoníaco
Lutando com o irado
Gargalhando com o sensual
Seduzindo o tímido
Limpando o nariz sujo e costurando camisas rasgadas
Mandando filósofos para casa com suas mulheres a tempo para o jantar
Afogando burocratas nos rios
Levando mães para escalar montanhas
Comendo o comum]
apreciando que tanto possa ser feito neste precioso planeta do samsara.
Texto adaptado da introdução a Beneath a Single Moon: Legacies of Buddhism in Contemporary American Poetry. © Gary Snyder. Leia o texto completo em D/A Magazine

8.26.2011

Identidade persistente

Essa ideia de uma identidade persistente fez você vagar impotente pelos reinos inferiores do samsara por incontáveis vidas passadas. É exatamente isso que agora impede que você e os outros se libertem da existência condicionada. Se pudesse simplesmente largar esse pensamento sobre o “eu”, você descobriria que é fácil ser livre e libertar os outros também.




Se superar a crença em um eu verdadeiramente existindo hoje, você se iluminará hoje. Se superar isso amanhã, se iluminará amanhã. Mas se nunca superar isso, nunca ganhará a iluminação.



Este “eu” é apenas um pensamento, uma sensação. Um pensamento não possui inerentemente nenhuma solidez, forma ou cor. Por exemplo, quando um sentimento forte de raiva surge na mente, com tal força que você quer brigar e destruir alguém, o pensamento raivoso está empunhando alguma arma? Ele poderia liderar um exército? Poderia queimar alguém como o fogo, esmagar como se fosse uma pedra ou levar embora como um rio?



Não. A raiva, como qualquer outro pensamento ou sentimento, não tem existência verdadeira. Não pode nem ser definitivamente localizada em qualquer lugar do corpo, fala ou mente. É como vento no espaço vazio. Em vez de permitir que tais pensamentos selvagens determinem o que você faz, olhe para a vacuidade essencial deles.



Por exemplo, você pode se encontrar repentinamente cara a cara com alguém que você imagina querer te ferir, e surge uma forte sensação de medo. Mas assim que você se dá conta de que a pessoa, na verdade, tem apenas boas intenções em relação a você, seu medo desaparece. Foi apenas um pensamento.



Dilgo Khyentse Rimpoche